Diálogo inter-religioso: perspectivas a partir de uma teologia protestante - Final
Conclusão
O caminho do DIR tem desafios, tanto teóricos quanto práticos. A teologia católica, em nível mundial, tem produzido vasta literatura a respeito. A teologia protestante, de igual maneira, também tem feito suas contribuições à compreensão do que significa DIR, e na sua vivência, mais em outras latitudes que no Brasil.
O principal desafio teórico, para católicos e protestantes no que diz respeito ao DIR se encontra no nível teológico: como promover o diálogo sem abrir mão do proprium do cristianismo? Não será pela via da relativização que se conseguirá produzir verdadeiramente um diálogo. Quanto a isto, cabem as palavras de Lesslie Newbigin (1909-1998), bispo anglicano inglês que foi missionário de carreira na Índia e que foi um dos primeiros bispos da Church of South India (Igreja do Sul da Índia), uma união de igrejas locais congregacionais, presbiterianas, anglicanas e metodistas que se formou em 1947, logo após a Índia ter logrado sua autonomia política da Grã-Bretanha (CHURCH OF SOUTH INDIA, 2017). Newbigin foi um homem de síntese, não apenas entre tradições diferentes agrupadas debaixo do grande guarda-chuva do protestantismo, mas também quanto ao aspecto teológico propriamente, visto que pode ser descrito teologicamente como sendo a um só tempo progressista e conservador. Após comentar a posição de teólogos destacados no cenário do DIR, como os mencionados John Hick, Hendrik Kraemer e Karl Rahner, Newbigin afirma sua própria compreensão a respeito:
A posição que descrevi é exclusivista no sentido de que afirma a verdade ímpar da revelação em Jesus Cristo, mas não é exclusivista no sentido de negar a possibilidade da salvação do não cristão. É inclusivista no sentido de que se recusa a limitar a graça salvífica de Deus aos membros da igreja cristã, mas rejeita o inclusivismo que considera as religiões não cristãs como meios de salvação. É pluralismo no sentido de reconhecer a obra da graça de Deus na vida de todos os seres humanos, mas rejeita um pluralismo que nega a singularidade e o caráter decisivo do que Deus fez em Jesus Cristo (NEWBIGIN, 2016, p.234-235).
O desafio prático quanto ao DIR se manifesta de diferentes maneiras. Líderes eclesiásticos cristãos, protestantes e/ou católicos, talvez não se sintam confortáveis com seus fieis participando de atividades religiosas com fieis de outros credos. Afinal, o cristianismo é herdeiro de uma tradição missionária, nasceu com vocação globalizante (isto é, tem o espírito missionário “em seu DNA”), o que gera muita dificuldade em admitir a possibilidade que o dom da graça de Deus se manifeste em outras tradições. Cristãos que vivem em terras nas quais o cristianismo é minoria e/ou onde, talvez exatamente por isso mesmo, sofre perseguição, podem não se sentir à vontade com alguma prática do DIR. E líderes destas religiões nestes países talvez não vejam necessidade de abertura para diálogo com cristãos, visto serem a maioria nestas sociedades. Não obstante estas dificuldades, o DIR vai se tornar cada vez mais necessidade em um mundo que, graças aos avanços da tecnologia de comunicação em tempo real, e por força de movimentos migratórios, se torna cada vez menor.
Concluindo esta breve reflexão, citar-se-á mais uma vez Claudio Ribeiro:
Os objetivos dessa nova movimentação teológica e pastoral, em linhas gerais, residem na articulação dos elementos fundantes da teologia latino-americana – como a sensibilidade espiritual com a defesa da vida, dos direitos humanos e da terra, especialmente os dos empobrecidos – com uma visão ecumênica, dialógica e de busca de uma fundamentação teológica do pluralismo religioso. Um longo e árduo caminho está ainda por ser trilhado (RIBEIRO 2014, p. 149).
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